Este
artigo tem a finalidade de esclarecer (ou lembrar) aos atuais e
futuros agentes penitenciários para quê serve o sistema prisional e
a real função da pena.
Além
disso, vale lembrar que este foi o tema da redação do último
certame realizado, no caso, mais especificadamente, da função de
ressocialização do preso.
O
castigo, a pena, sempre foi o meio utilizado para repreender atitudes
que não poderiam ser toleradas em uma sociedade. Começamos com a
autotutela e evoluímos, para o que chamamos de Poder Punitivo do
Estado.
Segundo
Luiz Flávio Gomes, “a pena ou qualquer outra resposta estatal ao
delito, destarte, acaba assumindo um determinado papel. No modelo
clássico, a pena (ou castigo) ou é vista com finalidade preventiva
puramente dissuasória (que está presente, em maior ou menor
intensidade, na teoria preventiva geral negativa ou positiva, assim
como na teoria preventiva especial negativa). Já no modelo oposto
(Criminologia Moderna), à pena se assinala um papel muito mais
dinâmico, que é o ressocializador, visando a não reincidência,
seja pela via da intervenção excepcional no criminoso (tratamento
com respeito aos direitos humanos), seja pelas vias alternativas à
direta intervenção penal”.
A
pena, no nosso Direito Penal e Estado Democrático de Direito, tem
três funções: prevenção, repressão e ressocialização, que
serão tratadas em sínteses.
A
prevenção
vem com a função precípua de evitar a prática de delitos. Tem um
caráter “ameaçador”, onde a sociedade sabe que, caso alguém
pratique algum delito, terá uma consequência, sanção. Funciona
como uma pressão psicológica, onde o agente que planeja cometer um
ato ilícito, teoricamente, sente-se coagido, compelido a não
fazê-lo, justamente por medo da represália.
A
repressão,
como o nome já diz, vem retribuir o mal cometido pelo agente para a
sociedade. É a punição. Somente o agente que cometeu o ato
delitivo pode responder por ele, não transferindo sua
responsabilidade para terceiros. Além disso, mostra para a sociedade
que o mal cometido traz uma consequência, servindo o agente como
exemplo do poder punitivo do Estado; “este está pagando, caso você
cometa algum crime, vai pagar também”.
A
ressocialização,
principal tema deste artigo, tem como dever reintegrar o agente à
sociedade, trazê-lo de volta à comunidade, sem que este represente
possível perigo para a mesma. De todas as funções da pena, esta
com certeza é a mais eficaz para diminuir a criminalidade, mas
também a menos observada e respeitada.
Como
todos já devem ter percebido, a função preventiva da pena é a
mais “furada” de todas. Ninguém que já cometeu um crime parou
pra pensar nas consequências, consequências estas que o sujeito, na
maior parte das vezes, não faz nem ideia de como se dará
concretamente. Além disso, nunca vi nenhum agente dando uma olhadela
no Código Penal e repensando sua possível conduta. E, ao contrário
do que muitos pensam, não é a sensação de impunidade que leva
alguém a cometer crimes, ou mesmo os repetir.
Nosso
Código Penal precisa de reforma sim, mas não no que diz respeito as
penas. Aliás, nosso Código é referência para vários países de
“primeiro mundo”. O problema não está nas leis, mas no sistema,
no Estado.
Seguindo,
não preciso nem mencionar que a função de repreensão funciona de
forma excessivamente bem em nosso país. E não, não é castigando o
sujeito, tirando sua dignidade (se é que ainda lhe restou alguma),
que vamos dar um jeito na criminalidade.
Vamos
então nos atentar sobre a ressocialização. Mas ressocialização
de quem? Será mesmo que esses “crápulas” tem jeito? A grande
maioria, sim.
Antes
de tudo, devemos nos atentar, para quem são os criminosos. Em sua
maioria, os criminosos são negros, pobres, rejeitados pela sociedade
e esquecidos pelo Estado. Gente que, ou tentou emprego honesto de
toda forma ou que cresceu vendo que o crime “compensa”. Gente que
passou fome, que viu os filhos passarem fome. Gente que se viu
encurralada, sem saúde, sem escola, sem qualificação, sem
estrutura familiar. Em sua grande maioria, este é o retrato de
nossos criminosos.
Obviamente,
há exceções, mas a história está aí pra confirmar pra quem
quiser qual classe sempre foi desfavorecida e se voltou para o crime.
Além disso, o agente é sempre “vagabundo”, até ser o seu
parente ou conhecido que está atrás das grades. Neste caso, o
agente passa a ser um pobre coitado, que ninguém olhou por ele,
merece respeito e é um absurdo o que acontece dentro dos presídios.
Nós
temos aqui dois grandes problemas: os presos condenados e os presos
provisórios.
De
100% da população carcerária brasileira, cerca de 42% representam
os presos provisórios. Ou seja, é elevadíssimo o número de presos
que nem sequer foram condenados e muito provavelmente não serão
condenados, sejam eles inocentados ou por ter ocorrido a prescrição
da pretensão punitiva estatal. Mais ainda, não há a necessidade de
se manter esses presos provisórios (aqui é uma análise jurídica
dos requisitos, que não vem ao caso).
Os
restantes são presos condenados ou que já deveriam estar soltos,
mas ainda não o foram, seja por falta de interesse familiar ou de
falta de estrutura da Defensoria Pública.
Desses
presos condenados, quantos efetivamente foram ressocializados e não
apenas sofreram repressão? Como é que se dá a ressocialização?
Quantos deles terão chance de mudarem de vida na sociedade após a
cadeia?
A
ressocialização dá-se dentro do sistema carcerário. O sistema
carcerário tem que ser capaz de dar condições que muitas vezes o
agente não teve do lado de fora, como estudo, cursos
profissionalizantes e trabalho. Muitas vezes um apoio religioso e
familiar. No entanto, conforme sabemos, esta não é a realidade.
É
salutar pensarmos na importância desta função para a diminuição
da criminalidade e das diferenças sociais. Não podemos apenas
segregar alguém que, mais cedo ou mais tarde irá voltar para a
sociedade. É muito mais vantajoso alguém que adquiriu conhecimento
e meios de subsistência de volta a sociedade do que um renegado, que
criará um ciclo vicioso entre rua, delito e cadeia, cada vez com
crimes mais elaborados e cruéis.
A intenção não é trazer
uma solução específica, mas conscientizar aqueles que irão
ingressar no sistema e fazer com que haja um pensamento crítico, sem
olhar para o agente como um bandido qualquer, que não merece
respeito. É fazer com que mentes novas e críticas, unidas, possam
enxergar um novo mecanismo que, juntamente com os três poderes
Estatais, mudem a realidade não apenas carcerária, mas brasileira.
Somos sim agentes de mudança.
Escrito por:
Julia Mara Carrumba
cursa o 8° periodo de Direito.
Ótimo artigo, concordo plenamente com a Julia Mara Carrumba. O estado está enxugando gelo com esse método de "amontoar bandido". Remédio é a prevenção(como bem disse Julia Mara): educação, trabalho, ressocialização.
ResponderExcluir